Creio dever-te desculpas e ao mesmo tempo peço-te que me creias como um amigo desinteressado de qualquer outro sentimento que não seja este que me move a dedicar-te aquelas doces palavras que tanto te assustaram, o da amizade plena e terna.
Peço-te desculpas por que não cuidei de preparar teu espírito para conhecer devidamente minha natureza devota quanto às pessoas que estimo. Somente estas sabem como chegar aos meus recessos de alma sem se atordoarem com o caudal de afetos que aí lhes resguardo. Creia-me que são elas tão raras que me pergunto se nasci de fato para a amizade, se minha vida não tem por lei magna o isolamento deixando-me a debater entre as férreas grades da solidão existencial.
E cá na minha alma pulsa um desejo tão intenso de abarcar o mundo, as pessoas e seus sonhos como uma necessidade aflitiva de integrar-me às suas vidas e compartilhar com elas as emoções todas, sejam as negras e acres, sejam as cálidas e floridas. É isso que quero que me creias, depois de desculpar-me pelo intenso lirismo que verti aos teus olhos espantados. Talvez seja uma forma de altruísmo, uma dadivosidade de quem tem sede de humanidade e de quem, ao mesmo tempo, a teme.
Perguntaste-me por que alguém teria tanta curiosidade a teu respeito. Eis aí a resposta ou, pelo menos, uma das expressões que ela pode tomar no universo das palavras-sentimento em que vivo. Acresça a isso um fato que tomo por verdadeiro porque verdadeiros foram os meios que me permitiram a ele chegar – o testemunho daqueles que te prezam (dispensa-se citar nomes) e a sensibilidade que trago no peito para perceber facilmente a beleza de uma alma tão terna como a tua, o encanto de uma personalidade que sorri branda e angelicamente à amargura, embora possa recatar nos esconsos os ressaibos da dor. Essa é minha concepção de quem tu sejas, embora caibam aqui muitas qualidades que me cumpre omitir para não fugir à brevidade dessas considerações.
Arde em mim aquela faísca sagrada que une os espíritos em irmandade. Creia nisso tão somente, por que não vai além de suas necessárias fronteiras. À amizade!